ENTREVISTA DA SEMANA- BERNARDO OLIVEIRA- Tiro com arco

De todas as entrevistas que realizei até agora no blog, esta foi a mais completa. O mais incrível é que Bernardo Oliveira tem apenas 17 anos. Ele foi um dos destaques do Brasil nos Jogos Sul-Americanos de 2010, conquistando 4 medalhas de ouro em um esporte pouco praticado, o tiro com arco, antigo arco e flecha. Mas, não está disputando o campeonato mundial da Itália. Tentará a vaga olímpica em competições continentais. A entrevista do  Bernardo Oliveira foi tão espetacular, que deixei com 7 perguntas.
 
1- Porque você não disputou a seletiva classificatória para o mundial da Itália que está em andamento. Qual o critério de classificação olímpica do tiro com arco?
O mundial acabou caindo em uma semana crítica para mim na universidade, por isso nem participei da seletiva. No mundial as primeiras vagas serão disputadas. Boa parte das 128 (64 para masculino e 64 para o feminino). Depois, cada continente terá uma classificatória continental onde mais algumas vagas serão disputadas, somente por atletas dos respectivos continentes. Isso deve acontecer no final deste ano. Por último, no ano que vem, uma repescagem global vai oferecer as últimas vagas para atletas de países que não conseguiram nenhuma vaga.

2- Quais as chances do Brasil de classificar pelo menos um atleta para a Olimpíada, como aconteceu com o Gustavo Trainini em Pequim 2008?
Na classificatória aqui das Américas acho que nossas chances são maiores. É bem provável que EUA e México (que são fortes no cenário mundial) se classifiquem já no mundial, ficando de fora aqui na classificatória continental. Mas o que afirmo com maior certeza é: dificilmente o Brasil não conseguirá nenhuma vaga. A chance de mandarmos pelo menos 1 atleta é enorme. Estamos crescendo bastante nos últimos tempos e temos boas perspectivas para o futuro.
No tiro com arco e em vários esportes as vagas olímpicas são conquistas para o país. Então, só no ano que vem é que será decidido quem vai representar o Brasil em Londres, caso nos classifiquemos. Não sabemos como será a forma de seleção. Mas me considero bom boas chances de me classificar e poder representar o Brasil em 2012. Em agosto, vou me mudar para Campinas para treinar intensivamente. Um centro de treinamento está sendo montado, dentro do programa do Master Plan 2016.
 
3- Qual a importância do tiro com arco classificar alguém para Londres 2012?
Acho que a maior importância é solidificar cada vez a nossa participação nos Jogos. Marcar presença cada vez mais e evoluir também. Ter a tradição de sempre levar alguém e com isso incentivar os demais atletas para elevarmos o nível aqui. Temos que chegar a um ponto em que não nos preocuparemos mais com a chance de levar alguém ou não, vamos é nos preocupar com quantos vamos levar. Podemos chegar a um ponto em que estaremos sempre levando 4 - 6 atletas, e aí já podemos nos concentrar de verdade em medalhas.
 
4- Desde que o Rio de Janeiro foi anunciado como sede olímpica, você sentiu alguma melhora para a sua modalidade? 
Melhores condições de  treinamento, mais intercâmbio, mais patrocinadores?
Acho que a mobilização para 2016 está vindo tarde e ainda por cima lenta. Mas às vezes olho por outro lado e penso também que o simples fato de sediarmos os Jogos Olímpicos não deveria ser a única coisa a alavancar o esporte no país. Criar campeõs olímpicos exige muito mais do que 7 anos ou menos. Até virarmos potências esportivas como Rússia, China, EUA, vai demorar muuuito tempo, no mínimo 30 anos. Sediar os Jogos é uma ótima oportunidade para começar todo esse processo.

Como citei na pergunta 1, o Ministério dos Esportes está criando em Campinas (SP) um centro olímpico que vai abrigar várias modalidades, visando criar uma equipe competitiva para 2016. O tiro com arco está dentro deste programa, e em Agosto estarei me mudando para Campinas para me dedicar integralmente ao esporte. Esse programa visando 2016 já é uma grande mudança a nossa favor, visando profissionalizar mais o esporte. Já na parte de patrocínio, ainda precisamos correr mais atrás apoio. Não temos nenhum patrocinador fixo no momento.

5- Você foi um dos destaques do Brasil nos Jogos Sul-Americanos com 4
ouros. No que precisa melhorar tecnicamente para conseguir competir
contra os melhores do mundo?
O que falta não é técnica. Falta mais treino, mais volume. Outra coisa que falta para nós é um nível alto aqui no Brasil e na América do Sul. Ter arqueiros fortes atirando por perto puxa os outros para cima. Meu técnico cansa de me mostrar vídeos de garotos da minha idade que fazem pontuações muito acima da minha mas que tem uma técnica igual ou até pior.
 
6- Porque você resolveu praticar a modalidade? Quantas horas treina por dia?
Um amigo meu era vizinho do técnico aqui de Brasília, meu atual técnico, Christian Haensell, e por isso ele praticava o tiro com arco. Uma vez ele comentou do esporte e acabei me interessando. Fiz umas aulas, gostei bastante, comprei um arco e acabei ficando. No começo era uma mera diversão pra mim, passei alguns anos atirando sem muito compromisso. No começo, nunca imaginei que poderia chegar onde cheguei. Fico até surpreso quando penso na magnitude que as coisas tomaram. Quando vou treinar, não passo menos de 3 horas no campo. Geralmente treino em torno de 4 horas. Quatro ou cinco vezes por semana.
 
7- Qual o peso da concentração na hora de uma disputa de tiro com arco?
Peso da concetração numa disputa de arco?? Peso 1000! O tiro com arco é um esporte que exige muito da parte mental. A concentração e a calma são vitais para o sucesso nesse esporte, muito mais que em alguns outros. Como não envolve nenhum esforço físico intenso e adrenalina, manter a concentração para fazer tudo certo se torna essencial. É muito fácil na hora de uma competição importante, se deixar levar por pensamentos, e isso pode arruinar seu resultado. A Coréia do Sul é a grande potência no tiro com arco olímpico. Todos os recordes mundiais (tanto masculino quanto feminino) são deles. É quase incontestável a superioridade coreana. O feminino ganhou todos os ouros olímpicos por equipes desde 1988, e muitos no individual também. Mas no masculino, acontece algo engraçado: o masculino, que foi campeão por equipes 4 vezes nas últimas 6 Olimpíadas, nunca teve nenhum campeão individual. Mesmo os homens da Coréia se classificando sempre entre os primeiros, muitos sendo recordistas mundiais de alguma prova, eles nunca conseguiram ganhar nenhuma medalha no individual. Acabam ficando nervosos, e deixam arqueiros que são piores tecnicamente, porém mais fortes mentalmente, ganharem. Nos Jogos de Pequim, em 2008, um coreano chegou na final do ouro, e na penúltima flecha ele cometeu um erro que custou a vitória.